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Tati merecia viver – Por Patricia Fonseca

Existe muita morte besta no mundo. Mas morrer por falta de empatia para mim de todas é a pior. Tem gente que atravessa a rua e morre, pega um resfriado e morre, engasga e morre. Tudo morte besta. Mas morrer porque alguém disse “não” é a mais besta de todas.

A Tati morreu depois de esperar por dois anos um coração que não chegou. Meus olhos doem de tanto que já chorei. Ela era minha amiga e todas as vezes que ela internava (sei bem o que é isso) eu passava no quarto dela para visitar. Ela ia para Olimpíadas comigo, já era coisa certa. Só estávamos esperando o coração chegar.

A caminho do velório dela hoje me veio algo na cabeça:

“Deus nos dá dois presentes ao nascer:

Um deles é a vida. Esse ele nos dá para gente mostrar nossa CORAGEM. Porque viver pede muita coragem! Pede ousadia, pede que a gente se entregue de corpo e alma!

O segundo é o dom de dar a vida. Esse ele nos dá para gente demonstrar a nossa GRATIDÃO. Porque sabendo valorizar o primeiro presente queremos que outros também possam viver e sentir essa alegria.

A vida começa com coragem e termina com gratidão”

A Tati esperou dois anos e nesses dois anos (eu tive o cuidado de ir buscar os números exatos oficiais) 5493 famílias disseram “não” para doação de órgãos. Nesses mesmos dois anos 218 pessoas morreram esperando um coração. A distância entre os 5493 e o 218 é tão grande que nem precisamos que todos doassem para ninguém morrer na espera. Ela morreu de morte besta.

Olhando sua mãe, seu pai e seus familiares eu tinha apenas a certeza que eles não precisavam estar chorando, que suas amigas não precisavam estar vestindo preto. Ninguém precisava estar ali, nem eu. Ver o velório dela tão jovem, me fez imaginar como teria sido o meu velório se o coração não tivesse chegado. Tinha tantas, mas tantas flores lá que nem dava para ver a parede. Ela era muito querida. Imaginei que seria muito provavelmente algo bem parecido.

Mas não foi. Minha mãe chorou muito mas de alegria quando o coração chegou. Meu pai filmou quando eu fiz discurso na Uti agradecendo todo mundo. Meu irmão foi o primeiro a me ver acordar da cirurgia. E meu amor não me perdeu e vivemos cada dia dessa vida linda e maravilhosa que pulsa dentro de mim. E devia estar pulsando dentro dela.

Tem gente que não aceitou morte besta e foi estudar e assim criaram vacinas, tratamentos, cirurgias. Ninguém tem que morrer de morte besta.

Eu também não aceito sua partida minha amiga. E me despedir de você só me dá mais forças para lutar para que ninguém morra por falta de empatia, por um “não”, por falta de informação.

Eu sempre tive medo de virar uma estatística. Um dígito a mais na planilha de “pessoas que morreram na espera”. Ano que vem quando saírem os dados de 2019 eu não verei um número “x”, mas um “x – 1 + Tatiane Penha Losa”. Cada número tem um nome, uma família, uma história. Você não vai ser um número amiga. Você será lembrada. Te prometo! Luta comigo lá de cima para mudarmos tudo isso.

E para todos que leram esse texto levem para sempre em suas vidas:

A VIDA COMEÇA COM CORAGEM E TERMINA COM GRATIDÃO

APROVEITE A VIDA E DEPOIS DOE A VIDA.

4 comentários em “Tati merecia viver – Por Patricia Fonseca”

  1. Dione Dantas Sitibaldi

    Patrícia,
    Não conheço você e nem conhecia a Tatiane, não tenho nenhum familiar ou amigo na fila esperando um órgão e não vivo essa aflição…mas me dói muito ler esse seu depoimento… imaginar como tudo poderia ser diferente se esses números fossem ao contrário… imagine se houvesse fila de doadores… sinto muito por ela não ter conseguido ganhar um coração novo…dois anos de espera…e nenhum coração… é tão triste…tão doloroso… Que essa dor e indignação possam fortalecer mais ainda você, seus amigos e familiares e todos os que amavam Tatiane, para que muito em breve possamos ver a fila de doadores crescer tanto que faltarão pessoas para receber tanto amor!
    Eu sou doadora de órgãos!

    bj

    Dione

  2. Tatiana Alice da Silva Costa

    Chorei com esse depoimento.
    Acabo de me tornar doadora por causa dessa mensagem Patrícia.
    Obrigada.
    É difícil
    É um pouco de egoísmo..
    Mas com.esse gesto poderemos salvar muitas vidas..

  3. Patricia,
    Acompanhei por 2 anos e alguns meses a angústia do meu namorado Roberto, ( ele lutando a 6 anos, com cardiopatia dilatada e, ha quase 3 anos na fila) entre tantas internações e incertezas.
    Mas dia 25 de março de 2019 tivemos a melhor notícia: o coração chegou!!
    O misto de emoções tomou conta, o medo também. Mas tudo está indo bem e cada Dia uma Vitória!!
    #1salva8
    Um grande beijo, Caroline

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