Sempre frequentei a igreja, desde muito pequena. E desde que eu tinha uns cinco ou seis anos, tinha uma música de que eu gostava muito, que dizia: “prova de amor maior não há, que doar a vida pelo irmão!”. Eu amava quando o coral cantava, eu cantava junto e depois de ouvi-la, sempre eu me pegava pensando: “o que será que é doar a vida pelo irmão?”. Criança que era, levava tudo ao pé da letra e pensava comigo mesma que eu deveria pular na frente de alguém que fosse receber um tiro, e todo tipo de coisas assim, sempre trocando a morte iminente de uma pessoa pela minha.
Enfim, os anos se passaram, eu continuei a frequentar a igreja (olha eu e meus filhos lá!), e compreendi o sentido da música. Compreendi que ela usava de uma metáfora para falar sobre amor ao próximo.
Muitos anos mais tarde, quando eu esperava pelos meus bebês, sofri de uma doença rara, e a única opção para salvar a minha vida, após a interrupção prematura da gestação, era fazer um transplante de fígado. E assim foi feito. Lutei uma batalha grande pela vida, e venci.
E desde o início dessa luta, a fé que envolveu toda a minha história me impressionava e emocionava. Eu via a manifestação de amor ao próximo de todas as pessoas envolvidas – inclusive de diferentes religiões, é claro – de várias formas: nas palavras, nos cuidados e procedimentos médicos, nos olhares, na limpeza do meu quarto do hospital. E eu só sentia gratidão.
Aos poucos, aquela mesma música foi falando ao meu coração, e me lembrei da minha interpretação de quase trinta anos atrás: doar a vida, literalmente, pela irmã ou pelo irmão.
E então eu entendi. Quando eu cantava “prova de amor maior não há, que doar a vida pelo irmão” no sentido simbólico, não imaginava que poderia existir uma interpretação quase literal para a música.
Passei a ver a Doação de Órgãos como uma das formais mais diretas de prova de amor ao próximo ao nosso alcance.
Quer doar a vida pelo seu próximo? Se manifeste um Doador de Órgãos para sua família hoje mesmo.
Paula Trottmann é transplantada de fígado, mãe de gêmeos, gestora pública e doutoranda em ciência política.